APF + MATTOS FILHO - Reforma Tributária e o Terceiro Setor: especialistas discutem impactos e caminhos de adaptação para as fundações

Na sexta-feira, 10 de outubro, a Associação Paulista de Fundações (APF) promoveu um encontro virtual que tratou sobre os impactos da Reforma Tributária nas fundações e entidades sem fins lucrativos. O evento contou com abertura da presidente da entidade, Dora Silvia Cunha Bueno, que destacou o papel estratégico da Associação em fomentar o debate jurídico e técnico no setor fundacional.
A assessora jurídica da APF, Nicole Hoedemaker, ainda na abertura, destacou a importância do encontro diante do cenário de transição provocado pela reforma. “A APF entende que é essencial acompanhar de perto as mudanças tributárias, especialmente porque elas atingem diretamente a forma de atuação das fundações e o planejamento de suas atividades”, afirmou.
“Nosso propósito é oferecer às fundações instrumentos para compreender e se preparar para a nova realidade tributária do país”, afirmou Dora, ao agradecer a presença das advogadas do escritório Mattos Filho – Flavia Regina Oliveira, Juliana Furini de Vasconcellos Puntel e Waleska Lemos Morais, que conduziram a apresentação.
A complexidade da transição: o que muda até 2033
Abrindo a exposição, Juliana Furini de Vasconcellos Puntel, advogada da área de Impacto Social e Filantropia, apresentou um panorama sobre a amplitude da reforma e o cronograma de implementação. Ela explicou que a transição será gradual, com a substituição do PIS, COFINS, ICMS e ISS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que passam a compor um modelo de tributação sobre o consumo mais uniforme.
“O novo sistema prevê um período de convivência entre os tributos atuais e os novos, que vai até 2033. Nesse intervalo, as fundações precisarão acompanhar de perto a legislação infraconstitucional e os atos normativos que regulamentarão as alíquotas, os créditos e as isenções aplicáveis”, explicou Juliana.
A advogada observou que, embora as entidades imunes mantenham a imunidade constitucional, muitas delas realizam atividades sujeitas à incidência indireta, como prestação de serviços ou locação de espaços. “É justamente nesses pontos que pode haver impacto, pois a reforma muda a lógica de incidência e de crédito, afetando operações que antes estavam fora da base de cálculo”, pontuou.
Ela recomendou que as fundações iniciem um processo interno de revisão de contratos e fluxos operacionais, avaliando eventuais obrigações tributárias indiretas e revisitando cláusulas de repasse e reembolso de custos.
“A fase de transição será fundamental. Quem se antecipar e mapear riscos desde já estará em vantagem quando o novo sistema estiver em plena vigência”, concluiu.
Adequação tecnológica e novas obrigações acessórias
Na sequência, Waleska Lemos Morais, sócia da área Tributária do Mattos Filho, aprofundou os aspectos técnicos da implementação e chamou atenção para a dimensão tecnológica da mudança.
“A reforma traz um modelo de apuração mais automatizado, baseado em sistemas integrados de escrituração digital. Isso exigirá que as fundações revisem seus controles internos e invistam em ferramentas que dialoguem com o novo padrão de fiscalização”, explicou.
Waleska destacou que a unificação dos tributos e o método de crédito financeiro – que substitui o conceito atual de cumulatividade – representam um ganho de racionalidade, mas também impõem desafios. “A sistemática será mais lógica, porém mais rigorosa. Cada operação precisará ser registrada de forma precisa, sob pena de questionamentos e glosas de crédito”, alertou.
Segundo ela, a reforma também prevê a criação de um Comitê Gestor nacional para o IBS, que será responsável por operacionalizar as regras de arrecadação e repasse aos estados e municípios. “Esse modelo ainda carece de regulamentação detalhada, e será fundamental acompanhar os desdobramentos para entender como as fundações se enquadrarão nesse processo”, acrescentou.
Isenção, imunidade e o papel social das fundações
Encerrando o painel, Flavia Regina Oliveira, sócia da prática de Impacto Social e Filantropia, abordou o contexto jurídico das imunidades e isenções tributárias no novo sistema e reforçou a importância da segurança jurídica para o setor filantrópico.
“A imunidade não é automática: depende do cumprimento de requisitos legais e da demonstração da finalidade social da entidade. O desafio é garantir que, mesmo com o novo sistema, essas condições continuem sendo observadas e respeitadas”, afirmou.
Flavia explicou que o texto constitucional da reforma preserva as imunidades para templos, partidos, sindicatos e instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos, mas que a regulamentação infraconstitucional ainda poderá trazer interpretações restritivas. “É nesse ponto que o trabalho das associações, como a APF, será essencial – para garantir que a legislação mantenha coerência com os princípios constitucionais da filantropia e do interesse público”, destacou.
A sócia defendeu, ainda, a importância do diálogo entre as entidades para troca de experiências e construção de soluções coletivas.
“As fundações precisam atuar em rede, compartilhando boas práticas, modelos de compliance e estratégias de adaptação. O cenário é desafiador, mas também é uma oportunidade de fortalecimento institucional”, concluiu.
Encerrando o evento, Nicole agradeceu às especialistas do Mattos Filho pela exposição detalhada e reforçou o papel da APF em oferecer conhecimento técnico e orientação contínua às fundações associadas.
“A APF seguirá promovendo debates, encontros e materiais de apoio sobre o tema. Nosso compromisso é com a informação de qualidade e com a segurança jurídica das nossas associadas”, afirmou.
A presidente Dora Silvia Cunha Bueno também destacou a relevância do encontro. “É fundamental que o setor fundacional se antecipe às mudanças. A reforma não é apenas um tema fiscal – é uma questão de sustentabilidade e de continuidade das missões institucionais”, observou.





